LA MÁQUINA LÍRICA

[VERSÃO EM PORTUGUÊS ABAIXO]

Por Pollyana Quintella | Curadora

No es raro, en 2021, constatarnos de nuestra frecuente incapacidad para distinguir entre realidad y ficción. El caso es que el presente suena delirante: no hay acuerdo alguno sobre hechos sociales básicos, los parámetros de lectura de lo real han caducado o se han vuelto discontinuos y episódicos, y el pacto democrático parece cada vez más distante. Hay gente que adolece por todas partes. Entumecimiento, náuseas y vértigo. Se multiplican las abstracciones y se sustraen los estados de derecho. ¿Qué queda?

Sin embargo, si el proyecto de poder en curso es delirante a su modo, la fabulación también existe en cuanto fuerza propositiva, una estrategia de reinvención del mundo y producción de sentidos que se desvían de los modelos vigentes. Es la imaginación, después de todo, la que expande los horizontes negociables de lo posible y se afirma como una práctica social esencial para la construcción de identidades colectivas, afirmándose como una operación fundamentalmente política. Por lo mismo, los artistas aquí reunidos buscan en la fabulación una forma de sanidad: la posibilidad de vida.

Es en esa dirección que se produce A Máquina Lírica (La Máquina Lírica). Una exposición en torno a delirios y sueños, que aproxima ecos del pasado y susurros del presente, recordándonos que la memoria y la imaginación son instancias indisociables. Se sabe que es difícil imaginar sin hurgar, con más o menos intención, en los cajones del pasado. Y no es posible recordar sin una dosis de creación. Aun así, el pasado y el futuro son vectores que se cruzan y se transforman continuamente (como dice el dicho yoruba, “Exu mató un pájaro ayer, con una piedra que apenas arrojó hoy”). Aquellos que no recuerdan, y ni siquiera imaginan, están condenados a la corta y nublada visión del presente.

Además, trazamos diálogos entre artistas “populares”, “emergentes” y “consagrados”, poniendo en crisis determinadas categorías normativas que enmarcan la práctica artística. En este punto de convergencia, la exposición se anuncia como un espacio de suspensión: baraja los puntos cardinales, interrumpe los flujos del reloj e invita al público a deambular junto a obras que cuestionan los regímenes de visibilidad y producción de sentido.

Aquí, los enunciados son imágenes fantasiosas, direcciones oblicuas, alucinaciones, profecías, susurros y secretos que buscan torcer y friccionar la sintaxis de sus lenguajes, en el deseo de vislumbrar otros horizontes y reorganizar las relaciones entre vivos, extra-vivos, no-vivos, post-humanos, cyborgs y otros géneros. No será posible optar por la realidad o la ficción, sino solo para producir otras negociaciones entre estos elementos ante todo inseparables. Frente al sueño de la razón, reivindicamos la risa, el asombro y la locura como herramientas de supervivencia. Es necesario delirar en el país.

A MÁQUINA LÍRICA

Curadoria de Pollyana Quintella

Não é raro, em 2021, constatarmos nossa incapacidade frequente de distinguir realidade e ficção. Fato é que o presente soa delirante: não sobrou acordo algum a respeito de fatos sociais básicos, os parâmetros de leitura do real caducaram ou tornaram-se descontínuos e episódicos, e o pacto democrático parece cada vez mais longínquo. Há gente adoecida por toda parte. Dormência, enjoo e vertigem. Multiplicam-se as abstrações e subtraem-se os estados de direito. O que resta?

No entanto, se o projeto de poder em curso é delirante ao seu modo, a fabulação também existe enquanto força propositiva — estratégia de reinvenção do mundo e produção de sentidos desviantes aos modelos vigentes. É a imaginação, afinal, que expande os horizontes negociáveis do possível e se afirma enquanto prática social essencial para a construção de identidades coletivas, afirmando-se enquanto operação fundamentalmente política. Mesmo por isso, os artistas aqui reunidos buscam ter na fabulação um empreendimento de saúde: possibilidade de vida.

É nessa direção que A Máquina Lírica se produz. Uma exposição em torno do delírio e do sonho, que aproxima ecos do passado e sussurros do presente, fazendo lembrar que memória e imaginação são instâncias indissociáveis. Sabe-se que é difícil imaginar sem mergulhar, com mais ou menos intenção, nas gavetas do passado. E não é possível lembrar sem uma dose de criação. Mesmo por isso, passado e futuro são vetores que se entrecruzam e se transformam continuamente (como diz o ditado iorubá, “Exu matou um pássaro ontem, com uma pedra que só jogou hoje”). Quem não lembra, e tampouco imagina, está fadado à visão curta e nublada do presente.

Além disso, traçamos diálogos entre artistas “populares”, “emergentes” e “consagrados”, pondo em crise certas categorias normativas que enquadram a prática artística. Nesse ponto de convergência, a exposição se anuncia como espaço de suspensão: embaralha os pontos cardeais, interrompe os fluxos do relógio e convida o público a devanear junto a obras que questionam os regimes de visibilidade e produção de sentido.

Aqui, os enunciados são imagens fantasiosas, endereçamentos oblíquos, alucinações, profecias, sussurros e segredos que buscam torcer e friccionar a sintaxe de suas línguas, no anseio de vislumbrar outros horizontes e rearranjar relações entre viventes, extra-viventes, não-viventes, pós-humanos, ciborgues e outros gêneros. Não será possível optar pela realidade ou pela ficção, mas somente produzir outras negociações entre esses elementos antes de tudo indissociáveis. Ante ao sonho da razão, reivindicamos o riso, o assombro e o desvario como ferramentas de sobrevivência. É preciso delirar o país.

A MÁQUINA LÍRICA

Anis Yaguar y Sumé Aguiar, Anna Maria Maiolino, Aurelino dos Santos, Brasilandia.co, Chico Tabibuia, Cildo Meireles, Davi de Jesus do Nascimento, Eduardo Basualdo, Jarbas Lopes, Jorge Macchi, Laryssa Machada, Laura Lima, Luiz Alphonsus, Marepe, Panmela Castro, Paulo Pedro Leal, Pedro Escosteguy, Rafael Bqueer, Tadáskía, Thiago Honório, Wagner Olino, Yan Copelli

Galeria Luisa Strina, Rua Padre João Manuel 755, Cerqueira César, São Paulo, SP, Brasil

Del 21 de agosto al 9 de octubre de 2021